terça-feira, 24 de julho de 2012

"Álvares"







...Resumidamente...






"Álvares"


Tu, que inauguraste o cemitério,
Cujos despojos reencontrados por teu cão,
Sangraram as lanças das marés da arribação,
Quando exumaram tua ossada de cimério.

A ti, que a noite na taverna se embebeu
Do vinho amargo que serviam aos mendigos,
Tua antiga alma escarrou pelos jazigos
Quem um só copo de alcatrão te ofereceu.

Nas fibras do pulmão em tua cuspida,
Entendo que em tuas horas de agonia
Ansiaste mais da morte em tua ferida.

Enquanto, ao lado, teu espírito em jejum
As sobras celestiais da luz do dia
Cuspia com desdém um Deus-Nenhum.


(F.N.A)

"Diorama"







...Hecatombe, campo minado, guerra em trincheiras, fogo cruzado...








"Diorama"


Finge natureza, finge um habitat,
Finge a própria causa do naturalismo,
Se duvidar, finge o criacionismo
E o pessimismo de seu grupo celular;

Não finjas só! Finjamos juntos pelos poros
A gratidão desse suor em tua mesa;
O microcosmo em sua maior rudeza
Também protege a utilidade dos esporos.

Nos transmutemos. Não, melhor, criemos ramos
De uma colônia virulógica tranquila
A alimentar um hospedeiro com seus danos.

Nos asperjamos, se couber, a algum lugar,
Pra que ao beijar o pobre chão de uma vila,
Perpetuemos com veneno o próprio ar.


(F.N.A)

segunda-feira, 23 de julho de 2012

"Buena"



...Mark Sandman foi um excelente baixista, poeta valoroso e cantor trágico.

...Como se houvesse selado, na encruzilhada, aquele fantasmagórico artifício do contrato underground do Blues.



"Buena"


O Diabo o procurou com as mãos cheias de perfume
E matou sua sede servindo peito flácido e translúcido;
E Ele roçou sua barba com as unhas - de um jeito pobre;
E afagou seus cabelos com óleo velho e açafrão.

"Buena!!" "Buena!!" "Buena!!", fez o grito das horas
Em que muita encruzilhada os dedos charqueados
Torcem uma cascavel para espichar a Velocidade,
Com que Júpiter espremeu asas da carne azul de seus pés.

Rápido, traço em duas cordas bêbadas: acentos graves.
O frio industrial de Bogotá (farelo de sua ceia)
E a dor da perda e os versos magros e sustanciosos;

E que fosse a própria imagem Dele enviesada além de si,
Como o Blues, tecido de papel velho e amassado -
Contrato que se cinge com tinta do sangue das mãos.


(F.N.A)

sábado, 21 de julho de 2012

"Inner Self"




...O mundo anda desconsiderando a graça de sermos filhos espontâneos gerados do imenso gesto de Amor nos concedido pelas infinitas radiações Cósmico-divinas.

...Desrespeitosos com um incomparável Bem.




"Inner Self"


Há um espírito que segue, mansamente,
A memória ancestral dos argonautas,
Pais da Origem ao berço dos primatas
E que dessa geração somos semente;

Uma energia intracósmica e propensa
Às nobres compleições pela Beleza;
Anjo sagrado em augusta Natureza
A segurar a mão de Deus suspensa.

Todos os Homens, todos eles, todos,
Têm de aliança com este anjo alado
A proteção de Deus por eles todos;

- Mas a energia, essa energia, enfim,
De Homens sermos sua prole de herdados,
- Essa energia... ela se trai assim...


(F.N.A)

segunda-feira, 9 de julho de 2012

"Pó Compacto"






...Maior que o Engano é a Ilusão que a tudo arremeda...

Hoje, vou de Método Stanislavski...







“Pó Compacto”


Não compactuo, o ato compacto!!
Não pacto inato ao monstro fogo fátuo,
De um jeito cupincha, adepto ao inapto:
Extremo vício do vício do impacto.

Não compactuo o erro crônico –
Traço histriônico, nem confuso trato,
Pé de urtiga, comichão do mato
Ou desacentuo o algo olhar biônico.

Não tomo sapato por andar descalço
À sola do vício o encalço de alguém,
Pois meu duro calo é a dor do percalço.

De ato, acentuo: eu não compactuo
O sabor escrotal dos ovos de alguém,
Nem a alma de rato. Simplesmente, atuo.


(F.N.A)

“Cabeça de Prego”






...funciona igual a um chapéu, só que dá muita dor de cabeça...








“Cabeça de Prego”


Quão pobre é o idiota que padece
As costas sob o sol com uma bandeira,
Comprando confusão com a vila inteira,
Sonhando com as paixões que desconhece.

As posses que desfruta em mais valia
Ao mundo de um cabo eleitoral
Não passam de um chinelo, um Sonrisal,
Um boné de candidato e um rádio a pilha.

Cogita intimidade com o patrão,
Porque foi convidado pra um churrasco
Em que não comerá sequer Um pão.

É que foi destacado pra guarita,
Servindo de vigia: olhando os traços
De toda aquela gente tão bonita.


(F.N.A)

“Futuro Cinza”






Tenho sonhos cruéis; n'alma doente
Sinto um vago receio prematuro.
Vou a medo na aresta do futuro,
Embebido em saudades do presente...

(Camilo Pessanha)






“Futuro Cinza”


Uma nuvem que paira, mais que eu permaneça
Em seu longo aspecto de monção traiçoeira,
Observando-lhe as sombras que sobre a Terra inteira
Ela alcança, pressinto: talvez não esmoreça,

Se morrer todo arrasto em quanta tempestade,
Que nas nuvens revoltas alastram plantações,
Vales, casas, celeiros, vidas, rios, cidades,
Essa, em igual vendaval, arrasa corações.

Sinto a brisa correr pelas ruas agora;
E, depois e mais tarde, enquanto avança ao alto,
O corcel nos tufões desmembrará em sua hora

A suspeita e a descrença sobre nossa cabeça.
Mas insiste a avançar ao nosso Amor, de assalto,
Essa nuvem que paira, mais que eu permaneça.


(F.N.A)