
...As comidas nas aldeias do Pará acertam o nó na tripa igual um cartucho...
“Beiju com Manteiga”
Não herdo uma só sombra do Pará,
Da profusão das raças misturadas –
Eu sou um arabês com pó da estrada
Moldado na acidez tamba-tajá.
Não herdo dos indígenas que forjam
A casta dos meus primos consangüíneos,
Como a zarabatana engoma espinhos
Nas costas dos tatus que se alojam
No oco de meu bucho, quando como
A herança das comidas de meu estado –
As ervas, o açaí, o caju no pomo...
De todas as delícias que há na feira,
É a goma queimadinha do beiju
Que faz eu virar índio, sexta-feira.
II
Eu amasso o inhame e a caça com a mão
E cuspo em meu fermento de aluá
A liga de um sabor que, em Marudá,
Uma tribo matuxi comia com pão.
Pupunha com café. Na tarde, ao fim,
O fastio da bacaba e o tucupi
Sangrando um pato gordo... Um tucuxi
Encarno atrás de piaba e surubim.
Faminto como um búfalo, nos igapós,
Lambendo, nas juçaras, a rouquidão
Do canto esfomeado dos kai´pós...
Pará, panela velha, as tuas comidas
Me deixam à língua um rastro de extinção
No gosto de mil tribos esquecidas.
(F.N.A)
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