sábado, 13 de fevereiro de 2010

"A Tecnocracia do Suicídio"







...Um feriadão prolongado e a insolência divagada por quem não morre de um simples pulo da Ponte...









"A Tecnocracia do Suicídio"



I


Ponte Fernando Henrique Cardoso.
Uma noite de visões e sem filamento.
Sigo esfolado como a costa de um jumento
E espanto a vida pelo rio, meu cão raivoso.

O mole asfalto do aterro não é a ponte
Que vai de Asgard a Midgard, mas uma roça,
Unida por suas águas pútridas à outra roça,
Que fica a léguas de fumaça no horizonte.

Aqui, a noite empapuçada de fumaça
Amortiza em gelo seco minha narina;
E assim um rastro de faróis me alucina
Na luz ultrapsicodélica da Ayahuasca.

Vão as formas de desvãos e ferro bruto,
Que vi a treliçadeira pôr um a um;
E assentado sobre as costas do guaiamum,
Entorto os fios de cobre do meu furto.

Rechaço esse patíbulo de alferes,
Daqueles que se dão nessa derrama
Ao mouco que deitar por esta cama
De arame com fagulhas e ampéres.

Não quero, esquartejado num buzu,
Meus membros ou minhas articulações
- Numa desova de anônimos culhões,
Incinerados pela Praia do Caju.

Mais um inimigo afogado num porão
Ao humor da sociedade e do regime,
Na ousadia ao falar e ter feito o crime
De apontar a mão de Tântalo ao ladrão.

Vem-me desejo de pular por sobre as pedras
E nelas descer amortecendo meu esterno;
Ver o meu baço perfurar num spleen mais terno
Perante os olhos petrificados dessas Hydras.

Não caibo na avareza dos mudernos
O grito de "anauê!" aos integralistas;
Ou sabão feito de infante a um comunista
Que umecta sua ética ao Baixo Clero.



II


Disposto com as chagas da Imprensa,
Que vende a própria mãe por Abadá,
Eu sinto as convulsões de Shangri-la
Na cura inexistente à minha doença.

Eu vôo a este cartão de treva e ócio
E sinto só os anzóis dos que infringem
Fisgar minha moral, e muitos cingem,
Que Bloom tipificou de mau negócio.

Caim que foi Caim é nesta terra
Louvado como Hermes e Dionísio;
E o Abel, morto – não fora nos Elíseos –
Aqui se esquece, pois o Bom se enterra.

Dos Aurenys às putas da União,
Não há um só tumular Ser dos baixios
- Monstros incultos, desses quais eu rio –
Que não seja um muar em seu quarteirão.

Terra de rudes e de bem rudes em feição
Do mau atendimento à porta do boteco,
Como se fosse o cliente um marreco
Que leva tapa por cagar no próprio pão.

Desconfiança, desfavor, ódio e vileza
Se espalham ao vento seco pela serra
- Olhos esquivos, traição e o pó da terra
Retemperados com conluio e malvadeza.



III


Há desperdício de futurismo a estes cães
- Ícones fartos, que entopem seus gracejos
Do que pior o lixo inculto sertanejo
Legou incólume aos úteros de suas mães.

Porque a mente belicosa desses Seres
Não engoliu, não digeriu e nem pensou.
E o que valeu a quem o Estado planejou
Petra erigida ao abandono dos saberes?

Penam Niemeyer, o cavaleiro da Esperança
E o panteão deposto os sóis numa tragédia –
A ignorância (língua herege que faz média)
Venceu o peso e o fiel dessa balança.

Morte à Arte e à Cultura por revanche,
Que engata um hino nazi-cômico e afã
Tão parecido com os tais hinos Talibãs,
Que destruíram pobre Buda num desmanche.

E algo pior no Maoísmo do Cerrado
É a conivência da estrutura das Notícias:
Morta Inês, a Dinamarca e a Galícia,
Tudo que afronte o velho rei é censurado.

Os co-autores da tragédia em Leningrado
Puseram tanques midiáticos de Dresden,
Afora os cercos inimigos que ora seguem
E que alteram até o peso de Avogrado.

Sobra de Hunos, burgo mestre de coiotes,
Restos de casas sem ardor da independência,
Que lhes valeu esta cisão de flatulências,
Senão um peido aprisionado entre magotes?!?!

Como lambemos o ementhal com caruru
Em sanitárias condições de dar suspeita,
Dessa lavagem cerebral espero a receita
Que talhará o sang´real do Gabiru.

Cetro sem linha hereditária não vigora –
Não de Borgonha, Carolíngia ou de Bourbon –
Mas essa linha de genoma do jeton
Toda cidade engole aos risos da Pandora.

Terra fantasma, pelo visto, na contagem
- Porque o caos duma tragédia ergonômica
Do populismo numa força super-sônica –
Expurgará os deserdados da pilhagem.



IV


Vejo MacCarthy quando eu encaro algum
Jovem colega sedentário e omisso –
Com a moral igual a ponta de um caniço
Bem vergastada delatando qualquer um.

Abaixo seguem oitenta metros de mergulho
Que o mau jeito no pescoço me espera.
Sinto um resquício – a Sagração da Primavera –
De um amoral que vive às custas do orgulho.

Quais os sensíveis domam deste passarinho
Aquele canto? Dorivã - talvez o primeiro –
Desceu o acorde acrobata em morte e cheiro
Verde de praça sem coreto nos caminhos.

É um sabiá que senta à grade e me acorda,
Porque não dormem os que matinam na verdade.
E aquele impulso de pular morre em metade
Como um suicida que esquece a própria corda.

Porque o suicida é, do pior, o perdedor;
E sobre ele e a mim aguarda o purgatório,
Como John Milton versejando o redentório
De um paraíso destinado ao malfeitor.

Mas, sei, até pra desistir do próprio fado
Do sentimento de tristeza que incomoda,
Nunca encarnei De Lacroix o calor da moda
Filosofando com pigarro derrotado.

Enfrento a dor do humilhado e do banido,
Porque a vida é o Habeas Corpus de vilão
E uma Ordem de Prisão ao sem culhão,
Que muito passa pela dor sem ter sofrido.

A revoada da Siriema desvela a noite,
Como as mensagens solitárias do Pierre –
Telas e Luzes pra que essa sombra encerre
Tudo que o ácido quebra fórmulas de açoite.

Daqui da ponte, Palmas já não vê a aurora
Cobrir de ventos e de poeira seu calor.
Sinto a presença que a mão do Redentor
Pesa tristíssima sentença que apavora.

Do que ao passado as estátuas foram sal,
Sobre esta casa que criamos e usurpamos,
Futuro negro sobrará por nosso engano
E sal seremos por bebermos mesmo Mal.



(F.N.A)

Nenhum comentário: