sexta-feira, 18 de junho de 2010

"Ficha Corrida"




...A Justiça é cega, mas, às vezes, suspende a tira dos olhos!!





"Ficha Corrida"


Bandido que tem ficha quilométrica
Em arquivo de DePol entende a gíria -
"-Esse doutor, que não morou em Brasília,
Bem merecia ir pra cadeira elétrica!"

Mas, cá, neste cercado, se um é punido
Com o mínimo de pena já conforta a alma -
Hoje, depois de já ter perdido a calma,
Pude alegrar meu coração ferido!

A Justiça Divina agiu com certo atraso,
Mas um exemplo impune, que andava sorrindo,
Chora os planos desfeitos de seu vôo raso.

Só daqui doze anos, se inda houver Justiça,
É que alguém lembrará dessa lesma mentindo.
Quem foi rei já não é mais que uma podre carniça!


(F.N.A)

quinta-feira, 17 de junho de 2010

"A Contradança"





...Um albatroz que se prepara para o vôo e desengonça com o balé entre suas pernas...

...Não é fácil dançar sem ter sido tirado. Pior é tirar, não ser aceito, e ter de dançar sozinho...







"A Contradança"


Não sei dançar tango no escuro
E sei bem menos pular frevo na ladeira,
Mas sei dançar aquela arte brasileira:
Sobreviver a caos político sob o muro,

Dançando sob caco, prego e gerânio,
Sangrando e retorcendo-se inteiro -
Igual o malabarista ao picadeiro:
Caiu do arame, inda rachou o crânio

Dançando com meus passos de idiota,
Redimo os que não sabem nem dançar,
Conforme a oblação que alguém provoca -

Gritos e vaias, convulsões e histeria,
Loucos varrendo suas garras a alcançar
Minha goela, por eu dançar sem companhia.


(F.N.A)

"Laranja Sadia"





...Mais uma vez, a corrida está ganha e não precisam mais de bestas leais... Agora!





"Laranja Sadia"


O tiro no pé circunda a mesma quadra,
Aonde ninguém sabe o necessário -
É um estado de euforia e o mandatário
Ilude a cada besta quando ladra.

Os apoios fictícios e o abecedário
De contas no papel em que se esquadra
Com números de votos e a patuscada
Enganam até bandidos partidários.

De erro em erro, na falta de conversa,
Por causa de arrogância e causa ganha
Já mudam a votação sem muita pressa.

Ali, quem é correto é posto a besta -
Laranja que é sadia e mais apanha
Por discordar das podres que hão na cesta.


(F.N.A)

segunda-feira, 14 de junho de 2010

"Ladrões de Bicicleta"





...Mais um clássico do canal TCM - a tv ideal para cinéfilos, como eu...

...Filme clássico italiano de Vittorio de Sica, num lindo contexto - momento de tragédia ante a farra feliz dos que não andam a pé....





"Ladrões de Bicicleta"


Se, neste cercado, morasse Antônio Ricci
- Desempregado: dois anos de miséria -
Por falta da magrela (coisa séria!)
É que não ficaria sem holerith.

Na depressão pós-guerra desse estado,
Em que eu, um paranóico sem ofício,
Sou tanto, como os que passam suplício
E exibem a honestidade por atestado.

Nesta terra, o mundo não nos é tão perto -
Na avenida distante, vislumbro os poderes:
Da favela ao Sultão, a distância é um deserto.

Pelo bem e pelo voto, logo um decreta:
"Um menino não vota, mas tem seus deveres -
Trocar voto do Pai pra ganhar bicicleta!"


(F.N.A)

sábado, 12 de junho de 2010

"Mendigo de Partido"



...Peregrino entre dois templos, acudindo ajuda, piedade e prestígio tardio...

...Todos os santos, por lá, já tem seu andor, pois cheguei atrasado na missa de reconhecimento por trabalhos prestados...




“Mendigo de Partido”


O partido é a minha porta de igreja
E a cara de paspalho com que olho
A extrema unção que alguém balança o óleo
À forma parasita em minha peleja,

Me deixa igual um legitimo abestado,
Que achou em chegar atrasado na partilha
E, enfim, se contentou com a armadilha
Que fisga legionários sem passado

De mendigar que nem um sibarita,
Que irrita quem se atrasa à pregação,
Porque lhes obstrui acesso à cripta.

Eu, hoje, sou igual cego de escola
Que aguarda a molecada no portão,
Sujeito a levar cuspe por esmola.


(F.N.A)

"Marcelino, Pão & Vinho"





...A ficha limpa deste pobre órfão contaminou as platéias do país, em 1955...

...Gosto desse filme clássico – a arte de dividir o pão, Marcelino entendia bem...








“Marcelino, Pão & Vinho”


Amigo oculto ao sótão, Marcelino
Podia alimentar e estar presente,
Na fina evolução que habita um crente –
A fé move montanhas do caminho.

Suado, como um gordo num SPA,
Já o órfão da cadeira chora as mágoas –
“Eu fui um homem bom! Pequei por dar
Esmola, marmitex e colchão d´água...”

Alguém cedeu ao santo o microfone
E nem bem lançou campanha sem mandato
Pra trinta lhe acionarem ao telefone.

Amigos de orfanato – empresas “sérias”-
Cansados dessa fome de contratos...
“Celinho, tira a gente da miséria!”


(F.N.A)

sexta-feira, 11 de junho de 2010

"Pais de Família"


...Num território vitimado por espólios de guerra política, ser Pai de Família é isso...



"Pais de Família"


No tempo em que ser Homem era negócio,
Quem tinha honra e zelo com a sua imagem
Distava-se bem longe da bandidagem,
Pois Homem não é Artesão de Puta e Ócio.

Se era Pai, mantenedor, sujeito honrado,
Exemplo de moral e Amor aos filhos;
Apego à tradição, mesmo que o brilho
Da mansidão fosse um altar quebrado.

O mundo foi girando e, hoje, o conceito
De ser Pai de Família é ter emprego
Fantasma, é ser ladrão e é ser suspeito,

É ter um pistolão, é ser traíra e meliante
E, ao fim dessa jornada, achar o apego
Do Lar, depois ter fudido a nova Amante.


(F.N.A)

terça-feira, 8 de junho de 2010

"Castelo Branco"


...Quem te conquistará, Blanc Chateau? Tu que és o último resquício do feudo do Norte.




"Castelo Branco"


Branco Castelo que a todos enamora
E faz romper, do calabouço, um novo amante,
Entre teus muros, um cavaleiro bem distante
Já trespassou tua guarda frouxa de senhora.

Todos que, hoje, te anseiam por domínio
E todos outros que, um dia, em ti entraram,
Ninguém te sabe como é triste o vaticínio:
Ser fortaleza num condado onde enterraram

A própria história dos Barões e Coronéis;
E, hoje, como um palacete sem monarca,
Ninguém invade teus salões em gris corcéis.

Não obstante, descartado, não és mais belo,
Alguém te soube da estrutura ruim e parca,
Pois és de areia construído, meu Castelo.


(F.N.A)

"Siameses"






Ok, ando nostálgico, existencialista e melancólico.

Pô, o mundo não é só críticas, críticas e críticas.








"Siameses"


Vislumbre, meu amor - há uma sina:
De sermos siameses nesta vida -
Em ti grudado e, em mim, você, querida,
Como duas reses a tomar vacina;

Ou, então, duas estrelas pequeninas
Que orbitam, como elétrons frente ao núcleo
De um átomo, bailando absolutos
Seres do Espaço à luz matutina.

Firmados, como velcro e aderente;
Grudados, como sola e superbond;
Ligados, como cárie e dor de dente:

Irmãos, mais que amantes e amigos;
Pois finda a vida, ao se cruzar a ponte,
Quero cruzá-la, meu Amor, contigo!


(F.N.A)

sábado, 5 de junho de 2010

"Desconhecido"






...Nem os morcegos de Rorschach me espantam mais!





“Desconhecido”


Eu sou a própria dúvida, um equívoco,
O viço da incerteza em ser mais alma.
Talvez eu não tivesse, hoje, essa calma,
Se eu descobrisse em mim como sou louco.

Um canibal que se resume, um pouco,
Na própria fome e a herança de estrangeiros –
Em temperar quem irei comer primeiro,
Amaciando a carne dando soco.

Desconfiado com minha carcaça,
Tomo a dar voltas, quando vou pra casa,
Vendo tocaias ao redor da praça.

Nada me fio – Deus, haxixe, algum amigo...
Somente a fera, em Rorschach, abre a asa
Na psicose que me acolhe em seu abrigo.


(F.N.A)

"Munch"





...Na maioria das vezes, me sinto o personagem desse quadro, onde se desespera a simbiose perfeita entre o que sou e meu estado d´alma...






“Munch”


Uma ponte. Essa é a ponte em que grito terrificado.
As mãos me arrancam da face o horror extremo no pânico –
Grosso prospecto cadáver do desespero, onde grito:
Garganta irritada ateando fogo às cordas vocais.

Quero gritar, mas nenhum som quer se aliar comigo:
Sem diafragma ou alarido acuando cachorros.
O sol sangra o arrebol por trás da minha tesa nuca;
A garganta expele escuridão para um horizonte distante.

Essa é a mortalha cinza e negra igual teus olhos,
Que visto como fosse a malha nevral de tua retina
E, só daí, desse instante, começo a ver os horrores que vês.

Fosse isso, talvez, minha angústia na ponte –
O ensaio da tarde desmaiando no ocaso
E o grito incapaz de impedir que eu morra.


(F.N.A)

"Fóssil Irresoluto"






...É uma questão de rebeldia e genética da hombridade, mesmo.

...Sabe aquele foda-se definitivo aos perdulários? Pois é. Taí!!






“Fóssil Irresoluto”


No dia em que o cerrado virar sal
E do sal virar oceano e abaixo um sismo,
Da plataforma, a sonda, ao denso abismo,
Alguém achará meu fóssil de metal.

Porque daqui não saio – além por própria conta
À busca do saber, dos livros e do frio,
Da luz do continente que afundou no rio,
Mas não irei por medo de quem me afronta.

A solidão do bravo e a sanha do atrevido
Percorrem minha medula com o veneno ósseo
De pragas, como eu, em pastos combalidos.

Ninguém, além de Deus, irá me impor degredo!!
Mesmo a Terra cuspindo o próprio sacerdócio
E o mar se afogando, eu não arredo um dedo.


(F.N.A)

"Cardápio"






...No final das contas, vamos todos ser papados!!







“Cardápio”


Uma panela grande – isso é o mundo!!
E, nós, uma carne solta e diversa.
Enfim, simplificando essa conversa:
A graxa óssea no teu prato fundo.

Djins e ghulz, Frost e Nixon, um segundo!
Não somos mais que gansos na travessa,
Por isso o medo de morrer nos interessa
Em não sofrer neste umbral profundo.

Iblis perfuma os fracassados e os descrentes,
Que morrem à míngua no complexo sabor
De maturado sangue espesso entre os dentes.

A humanidade está servida nesta janta,
Onde o Diabo é o convidado do Senhor
E sua gula por comida nos espanta.


(F.N.A)

"Abismo"






...Na verdade, não anseio muitas guerras e nem correspondências do front.

...Viver já é foda!







“Abismo”


Salinger sabia da vertigem ao precipício
E nada mais sei, que não seja queda livre.
Não há ninguém para frear minha derrocada,
Nem me apanhar pelos braços ou me dar a mão.

Desde que a vida me descobriu moleque,
Quietinho e seviciado no açaizal,
Nunca mais tive paz ou permaneci camaleão:
Outdoor sem anúncio a sorrir aos pichadores

Carro das pamonhas a gritar enfados,
Achei de abismar horóscopos e muiraquitãs
Nas horas úteis e inúteis dessa peleja.

O conselho pra me jogar recebi do ostracismo –
Tantos quilos de orgulho a espalmar o chão,
Tantos gritos de súplica aos indiferentes.


(F.N.A)

"Conclusão"





...Nossa vida e o sentido dela é a síntese da máxima: do nada pra lugar nenhum!"






“Conclusão”


Não iremos a lugar algum, pois já morremos!
Não ter desdobres em arroubos de caráter!
Nada que existe segue a fina dura mater –
Para o universo em nada importa o que sabemos.

A antimatéria está aí e nós não vemos,
Porque seguimos enfurnados num capuz.
O absurdo consciente em Albert Camus
Foi deduzir-nos imbecis - nem mais, nem menos.

Um transplantado, esse sim entende a vida
Em seu valor de respirar e sentir-se vivo –
O factível do sentido é a natureza!

Fora extremados, qualquer força está esquecida,
Pois, mesmo o carma com algum princípio ativo,
Já formulou-nos muito mal em sua grandeza.


(F.N.A)

"Ave Senzala!"


...A fazenda é assim: Sinhô desce taca no lombo, enquanto (quem apanha) grita "OBA!!"



“Ave Senzala!!”


Um ancião, senhor de velhas terras,
Comendador da Ordem do Mastruz,
Servia carne escrava aos urubus,
Tamanha era a sua lavra de pantera.

Sangrava seus escravos na tapera
Com a graciosa arte de Zé Ramos:
Cortando-lhes no açougue de seus planos –
Barão conquistador de toda a esfera.

Um dia, na moenda, em sua fazenda,
Pego um escravo que roubara a venda,
O coronel lhe armou, no tronco, o pelourinho.

Como senhor temido àquelas redondezas,
Disse o escravo no açoite, em gentileza:
“Bata com gosto, pois eu mereço, Paizinho!”


(F.N.A)